quinta-feira, fevereiro 08, 2007

Mais senso crítico e menos Lucio Ribeirisse


A definição de Indie por um Indie, segundo a Desciclopedia, é a seguinte: “Sou extremamente culto, inteligente. Me visto de maneira fuckin' stylish e tenho gostos excelentes. Odeio tudo que é pop. Amo o underground.”

Por que eu comecei esse artigo com essa definição? é que o Indie não se aplica apenas a músicas, mas sim a qualquer situação onde impere a questão da novidade, do recente, do algo novo. Veja mais esse trecho: “Para se afirmar ”real" na tribo Indie, o mesmo deve eleger como banda preferida uma banda que ninguém mais conhece e dizer que é a melhor coisa do mundo e, se ele conhecer mais pessoas que conheçam a banda, ele a considerará mainstream e elegerá outra banda desconhecida como sua preferida.”

O representante-mór da tribo indie é um jornalista chamado Lucio Ribeiro, especialista em novidades do mundo do rock. Indie rock, é claro. Ou seja, qualquer banda que seja do underground, que não tenha gravadora, que distribua suas música apenas via internet, com os My Space e Last.FM. E, o mais importante, claro: que absolutamente mais ninguém tenha ouvido falar.

Bom, enquanto esse for um estilo(???) apenas do Lucio Ribeiro, menos mal. Ninguém é obrigado a ler os textos do rapaz.. No entanto, a coisa começa a ficar feia e chata quando esse fenômeno se espalha para outras áreas do enttretenimento, que é o que está ocorrendo agora com os já saturados seriados americanos.

O melhor seriado do mundo até pouco tempo atrás, Lost, agora é substituído por um tal de Heroes. Algumas pessoas já vieram falar para mim, com brilhos nos olhos, que Heroes é a coisas mais sensacional da face da terra.

O momento auge para essas pessoas é quando você argumenta com um simples e factual - “mas como eu vou assistir a esse seriado se ele não passa no Brasil”? - a resposta vem imediata: “oras, eu baixei na internet. Assim que passa no Estados Unidos, eu já baixo na Internet”.

Ahá! Achamos o ponto! Analisemos com calma: a mesma pessoa, a singular e única pessoa que se predispõe a ir até o computador e baixar o episódio do tal seriado minutos depois de passar nos USA, depois vem e vocifera com todas as letras que é a coisa “mais legal que ela já viu na face da Terra”. Qual a relação?

Vejo com tristeza que estamos criando uma geração de “Lucios Ribeiros”, onde o verdadeiro hype não é o seriado em si: poderia ser o Lost, o Heroes, o Vilains, o raio que o parta: o que importa mesmo é ver antes do outros e propagar para todos os cantos: “sim, é a coisa mais legal do mundo!”. Mais ou menos como um típico Indie fala sobre uma banda nova. Neste novo cenário, o “legal” é ser o único a ter visto, não importando a qualidade do programa em si.

Alerta vermelho! Temos pela frente o perigo iminente de cair numa cilada: um novo tipo de tribo, onde o sujeito ter ou não visto algo o desqualifica de forma veemente.

Uni-vos, pessoal: se tal programa, banda, filme ou o que quer que seja, for merecedor de crédito, façamos isso. Agora, ficar elogiando algo apenas porque você viu e os outros não, é patético. Por favor: mais senso crítico e menos Lucio Ribeirisse.

Indignação com a Folha de São Paulo

Sou assinante da Folha de São Paulo há mais de 4 anos, desde Agosto de 2002.

Resolvi ligar para cancelar minha assinatura, pois, apesar de adorar o Jornal, não tenho tido mais tempo de lê-lo.

Apesar de meu longo relacionamento com a empresa, fui tratado como um consumidor qualquer, por um atendente que apenas quis me convencer, insistentemente, de continuar com o jornal. Foi um monólogo patético do vendedor, apenas me cobrando justificativas do porquê de parar de assinar o jornal, sem me oferecer reais vantagens de continuar com a empresa.

Finalmente, depois de ter sido "desqualificado" pelo vendedor, acabei conseguindo efetivar o cancelamento da minha assinatura.

Depois de todo esse desgastante e estressante processo, eis que eu descubro que, enquanto para mim, assinanante do jornal há mais de 4 anos, fiel, com renovação automática, que nunca ganhou nada, a Folha não oferece nada de especial, para um qualquer, que nunca leu o jornal na vida, ela oferece mil brindezinhos e coisinhas para atrair novos assinantes.

Veja só, confira você mesmo => http://assine.folha.com.br/folha/assinatura/wass0085.asp

Ou seja: eu, um consumidor ativo da Folha, sou tratado como ninguém. Já um qualquer pode ir lá e assinar o jornal apenas por causa de um DVD Player, um Secador ou um Videogame.

Lamentável, Folha. Vcs não tem o Depto de Relacionamento? Vcs só pensam nos novos assinantes e esquecem os antigos? Vcs não sabem que é mais fácil, mais barato e agrega mais valor à Marca manter um leitor ativo do que apenas explorá-lo, e investir esforços apenas nos novos usuários?

Sem mais,
Thiago Reimão

 sexta-feira, fevereiro 02, 2007

Caranguejos Com Cérebro


por Fred Zero Quatro

O primeiro manifesto do Mangue, na íntegra e em sua versão original de 1992.


Mangue, o conceito
Estuário. Parte terminal de rio ou lagoa. Porção de rio com água salobra. Em suas margens se encontram os manguezais, comunidades de plantas tropicais ou subtropicais inundadas pelos movimentos das marés. Pela troca de matéria orgânica entre a água doce e a água salgada, os mangues estão entre os ecossistemas mais produtivos do mundo.

Estima-se que duas mil espécies de microorganismos e animais vertebrados e invertebrados estejam associados à vegetação do mangue. Os estuários fornecem áreas de desova e criação para dois terços da produção anual de pescados do mundo inteiro. Pelo menos oitenta espécies comercialmente importantes dependem do alagadiço costeiro.

Não é por acaso que os mangues são considerados um elo básico da cadeia alimentar marinha. Apesar das muriçocas, mosquitos e mutucas, inimigos das donas-de-casa, para os cientistas são tidos como símbolos de fertilidade, diversidade e riqueza.

Manguetown, a cidade
A planície costeira onde a cidade do Recife foi fundada é cortada por seis rios. Após a expulsão dos holandeses, no século XVII, a (ex)cidade *maurícia* passou desordenadamente às custas do aterramento indiscriminado e da destruição de seus manguezais.

Em contrapartida, o desvairio irresistível de uma cínica noção de *progresso*, que elevou a cidade ao posto de *metrópole* do Nordeste, não tardou a revelar sua fragilidade.

Bastaram pequenas mudanças nos ventos da história, para que os primeiros sinais de esclerose econômica se manifestassem, no início dos anos setenta. Nos últimos trinta anos, a síndrome da estagnação, aliada a permanência do mito da *metrópole* só tem levado ao agravamento acelerado do quadro de miséria e caos urbano.

Mangue, a cena
Emergência! Um choque rápido ou o Recife morre de infarto! Não é preciso ser médico para saber que a maneira mais simples de parar o coração de um sujeito é obstruindo as suas veias. O modo mais rápido, também, de infartar e esvaziar a alma de uma cidade como o Recife é matar os seus rios e aterrar os seus estuários. O que fazer para não afundar na depressão crônica que paralisa os cidadãos? Como devolver o ânimo, deslobotomizar e recarregar as baterias da cidade? Simples! Basta injetar um pouco de energia na lama e estimular o que ainda resta de fertilidade nas veias do Recife.

Em meados de 91, começou a ser gerado e articulado em vários pontos da cidade um núcleo de pesquisa e produção de idéias pop. O objetivo era engendrar um *circuito energético*, capaz de conectar as boas vibrações dos mangues com a rede mundial de circulação de conceitos pop. Imagem símbolo: uma antena parabólica enfiada na lama.

Hoje, Os mangueboys e manguegirls são indivíduos interessados em hip-hop, colapso da modernidade, Caos, ataques de predadores marítimos (principalmente tubarões), moda, Jackson do Pandeiro, Josué de Castro, rádio, sexo não-virtual, sabotagem, música de rua, conflitos étnicos, midiotia, Malcom Maclaren, Os Simpsons e todos os avanços da química aplicados no terreno da alteração e expansão da consciência.

Bastaram poucos anos para os produtos da fábrica mangue invadirem o Recife e começarem a se espalhar pelos quatro cantos do mundo. A descarga inicial de energia gerou uma cena musical com mais de cem bandas. No rastro dela, surgiram programas de rádio, desfiles de moda, vídeo clipes, filmes e muito mais. Pouco a pouco, as artérias vão sendo desbloqueadas e o sangue volta a circular pelas veias da Manguetown.

Dez anos sem Chico Science


Se alguém havia de empurrar a energia musical nordestina para dentro do rock’n’roll e fazer o mundo ouvir, esse alguém tinha de ter um apelido meio brasileiro, meio americano, meio tecnológico, algo assim como Chico Science. O homem nasceu em Olinda, em 13 de março de 1966 — mesmo ano de Marcelo Mirisola, Mike Tyson, Romário, Fernandinho Beira-Mar: mas que gente irriquieta! — e só teve 30 anos para “incentivar a música popular brasileira a ser realmente pop”, nas suas palavras. Em 2 de fevereiro de 1997, ele pediu emprestado o Fiat Uno Mille da irmã — seria difícil estacionar seu Landau 79 nas imediações do show ao qual levava um amigo. Pouco depois, perdia a vida ao bater num poste na divisa de Recife e Olinda.

A carreira musical de Chico Science começou nos anos 80 no grupo Orla Orbe, para o qual levou sua tendência rapper desenvolvida na participação na Legião Hip Hop, grupo de street dance. Depois surgiu o Loustal, banda em que Chico e seus parceiros Lúcio Maia e Alexandre Dengue misturavam rock, hip hop, ska, funk e soul.

Em 1991, alguns jovens reunidos no bar Cantinho das Graças, no Recife — Fred 04, que depois viria a liderar o Mundo Livre S/A — viram Chico Science chegar entusiasmado depois de uma jazz session com os integrantes do Lamento Negro, grupo de samba reggae da periferia. A percussão o entusiasmara: “peguei um ritmo de hip hop e joguei tambor de maracatu. Vou chamar essa mistura de mangue”. Da teoria à prática: ele juntou a turma do Loustal a percussionistas do Lamento Negro, como Toca Ogan, Gira, Gilmar Bola 8 e Jorge du Peixe, e estava fundada a banda Chico Science e Nação Zumbi. Ou melhor, estava fundado o mangue beat, que misturava rock, black music, rap, maracatu, música eletrônica e coco.

Como disse Fred 04, aquela geração percebeu que o Recife tinha muito mais a dizer musicalmente que Seattle, a queridinha da época com seu grunge. Formou-se um ambiente cultural propício ao desenvolvimento sonoro. O mangue beat teve até manifesto, o texto Caranguejos com Cérebro, escrito por Fred 04.

Entre 94 (ano do disco Da Lama ao Caos) e sua morte, ele “e a Nação Zumbi fizeram aquilo que somente um seleto grupo de músicos tem conseguido: criaram um híbrido capaz de evoluir até se tornar um estilo que um dia será hibridizado por outra geração” — palavras do crítico Neil Strauss no NYTimes após assistir a um show do grupo no Central Park em 1995.

Chico Science e seus parceiros gostavam de afirmar que o mangue beat era uma antena parabólica cravado no manguezal e trasmitindo para o mundo. Aliás, ainda transmite, tendo ecos no som de Mundo Livre S/A, Otto, Nação Zumbi, DJ Dolores, Lenine, Bonsucesso Samba Clube, Mombojó, Junio Barreto, Suvaca di Prata, Mestre Ambrósio, Siba, Cordel do Fogo Encantado, Devotos, Monjolo e Eddie.
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